Na tentativa de chegar até Abyaneh, uma das vilas mais belas do Irão, o nosso editor tem o seu primeiro contacto próximo com o povo Iraniano. Por entre boleias, almoços partilhados e rituais locais, é fácil perceber o porquê das gentes persas serem consideradas das mais bondosas e hospitaleiras do mundo.
Há uma diferença substancial entre simpatia e bondade. Há montes de povos simpáticos, mas muitos dos viajantes que têm a sorte de visitar a Pérsia retratam o povo Iraniano como sendo dos mais bondosos que já conheceram. Durante os primeiros 3 dias, fui inundado da simpatia local, mas ainda não me tinha deparado inteiramente com a generosidade e abertura iranianas… Até ter a brilhante ideia de ir à boleia até Abyaneh!
Escondida por entre as montanhas, a vila de Abyaneh é um dos locais mais adoráveis do Irão, sendo extremamente popular entre os locais. Apesar disso, não há nenhum autocarro que ligue as cidades de Kashan ou Isfahan, as duas mais próximas, ao pequeno povoado turístico, famoso pelo tom avermelhado das suas construções. A alternativa mais fácil passaria por contratar um tour privado, mas como tinha tempo em mãos, decidi por uma abordagem menos ortodoxa.
Chegado ao terminal de autocarros de Kashan, compro um bilhete para Isfahan. No entanto, friso no balcão que quero ser deixado a meio do caminho, em plena autoestrada, junto à saída para uma estrada secundária que conduz a Abyaneh, a cerca de 30km de distância.
Assim foi. Chegados à intersecção, o motorista sinalizou que deveria sair ali, despedindo-se enquanto ria, antes de retomar caminho com os restantes passageiros.
Começa a missão. De dedo em riste, tento em vão parar os parcos carros que vão passando naquela estrada secundária. A maioria olha e segue. Uns vão fazendo um sinal que, presumo, nos passa a mensagem de que o carro vai cheio. Pára finalmente um veículo, mas lá dentro vão dois polícias fardados que tentam perceber o que estamos ali a fazer. Quando se apercebem que somos estrangeiros, riem e pedem desculpa por não nos poderem levar, mas estão apenas a fazer a ronda por aquela zona. Ao fim de 30 minutos, confesso que estava a começar a fazer contas à vida e a tentar perceber a melhor forma de não dar ainda aquele dia por perdido, até que uma pick-up azul encosta junto a nós.
Lá dentro seguem Fatimeh e Hodi, um casal jovem de Isfahan, precisamente a caminho de Abyaneh para um passeio. Junto a si, nos assentos, levam uns sacos com alguns snacks, travesseiros, mantas e cobertores. Dizem que nos levam, mas que temos que ir na caixa aberta da carrinha. Naquele ponto, até já íamos amarrados ao tejadilho, se fosse preciso! Subimos para a traseira e agarramo-nos com força. Rimos da inusitada situação mas estamos felizes – afinal ainda há uns minutos estava a ponderar abortar a missão.
Passados uns 10 minutos, a carrinha volta a encostar. Com pena, os nossos dois novos amigos mandam-nos para a frente, à medida que atiram para a caixa aberta os seus sacos de comida e cobertores, libertando assim o espaço necessário. O seu inglês é tão bom quanto o nosso Farsi, e por isso a comunicação é feita com recurso a uma app de tradução. Explicam-nos que é o 13o dia desde o Nowruz (Ano Novo Persa), e que na sua cultura este é o dia de pegar na família e viajar até algum lado para um piquenique. Chamam-lhe o “Dia da Natureza”. Apesar de estarmos em pleno Ramadão, o Corão refere especificamente que os viajantes estão isentos de cumprir o jejum religioso, pelo que hoje todos os que se fazem à estrada podem comer o que quiserem, quando quiserem.
Num país onde a maioria da população é surpreendentemente laica e não cumpre sequer o Ramadão, percebemos pela conversa que os nossos dois amigos eram religiosos. Essa percepção confirmou-se quando nos explicam que o seu casamento foi tradicional. Quando pergunto o que querem dizer com “tradicional”, desmancham-se a rir e explicam que foi um arranjinho entre famílias. Já não é uma prática corriqueira, mas ainda existe. Depois de uma boa meia hora de apresentações e perguntas com recurso a telemóvel, chegámos finalmente a Abyaneh.
Dizem que, enquanto convidados, gostariam que passássemos o dia com eles. Descarregamos a carrinha, compomos o manjar com mais umas compritas de última hora nas mercearias da aldeia e seguimo-los rumo a um dos locais onde as famílias se reúnem para comer. Pelo caminho, percorremos as ruas antigas da famosa “Vila Vermelha”. É um Irão diferente. Longe da agitação dos bazares e da arquitectura monumental das cidades, Abyaneh é um rendilhado de ruas e becos flanqueados por pequenas casinhas em adobe. O solo da vila, utilizado no fabrico deste material pastoso que reveste todos os edifícios, é naturalmente avermelhado, fazendo com que toda a aldeia tenha o mesmo tom tinto e argiloso. Um sítio extremamente bonito!
Quando chegamos por fim ao local do piquenique, já várias famílias iranianas tinham montado o seu estaminé. Uns com mantas e outros com tendas completas, partilham o espaço por entre tachos e panelas, à medida que várias fogueiras são feitas para que todos possam assar carne e legumes. Encontramos um canto resguardado e ficamos a contemplar o panorama, enquanto continuamos a partilhar impressões com os nossos anfitriões. A cada pergunta sobre Portugal, retorquimos com outra sobre o Irão, e vamos assim ganhando uma maior perspectiva da realidade social e económica do país. Eventualmente, lá perguntamos o que pensam sobre os protestos recentes e a obrigatoriedade de utilizar hijab, ao qual nos respondem que cada um deve ser livre de utilizar aquilo que bem entender. Mesmo entre as franjas moderadamente conservadoras, o governo não parece ser propriamente popular.
As nossas interacções vão sendo interrompidas pelos acontecimentos em redor. Volta e meia, a multidão irrompe em cantorias e danças típicas. Novos e velhos, de cabelo tapado ou ao descoberto, todos se juntam e riem à medida que os intervenientes se vão substituindo uns aos outros no interior da roda. Uma espécie de freestyle à iraniana! Pessoalmente, o cenário faz-me lembrar os piqueniques em família em Samil, na Galiza (malta do norte dos 80s/90s, que se acuse) ou o convívio pré-jogo em dia de Taça no Jamor. Quanto mais viajo, mais me apercebo do quanto a essência humana é igual em todo o lado. Despidos da estética, da religião e dos costumes, a verdade é que o que sobra é praticamente o mesmo em qualquer canto do globo.
A tarde vai passando em ritmo de cruzeiro. Jogámos cartas, numa espécie de versão iraniana simplificada da nossa Sueca, trocamos impressões e aprendemos novas palavras. Pelo meio, ainda nos resolvem o problema do acesso livre à internet e transferem-nos duas VPNs que – garantem – funcionam no Irão (confirmadíssimo)! Como se não bastasse a boleia, a comida, o entretenimento e a companhia, ainda nos convidam a passar a noite em sua casa, proposta que somos obrigados a recusar por termos deixado todas as nossas tralhas no hotel de Kashan. Eventualmente, chega a hora da despedida e os nossos amigos fazem questão de se desviar da sua rota e de nos deixar precisamente na autoestrada que vai dar a Kashan. Despedimo-nos com um abraço apertado e a promessa de irmos mantendo contacto.
Erguemos o braço e ficamos continuamente a acenar, à medida que a característica carripana azul desaparece no horizonte.
Para contratar o teu seguro de viagem recomendamos a Heymondo, que tem aquela que é, para nós, a melhor gama de seguros da atualidade, com uma relação qualidade-preço imbatível, e que inclui também cobertura para os teus equipamentos eletrónicos.
Se reservares connosco, através deste link, tens 5% de desconto no teu seguro e, ao mesmo tempo, dás-nos uma ajuda preciosa 🙂
Aconselhamos a marcar a tua consulta na Consulta do Viajante Online. Segue esta ligação para marcar a tua consulta.
Reserva já os teus tours ou atividades no Viator, do grupo Tripadvisor! E ao fazê-lo estás-nos a dar uma grande ajuda 🙂